Sete meia da noite da sexta-feira
passada, eu estava de saída quando o telefone tocou. Era um amigo
querendo saber quais eram meus planos pro fim de semana. Eu respondi que
não sabia o que faria mais tarde, mas que naquele momento estava indo pra academia. Meu amigo indagou estupefato: "was?!?! Verteilen sie Bier heute da? Geht's dir gut?" o que em português quer dizer "o quê?!!? Eles estão distribuindo cerveja hoje lá? Você está bem?"
Quem me conhece bem entende a reação de meu amigo. Academia é o lugar menos provável do mundo para me encontar e a probabilidade de eu estar lá é ainda menor em uma sexta-feira à noite.
Pensando bem, a única coisa que me faria normalmente ir à uma academia
no fim de semana, seria se de fato eles estivessem distribuindo
cerveja. E mesmo assim só se todos os bares da cidade estivessem
fechados. Isso porque a imagem dos aparelhos na academia me lembram
tortura e todas aquelas pessoas bonitas, malhadas e saudáveis me fazem
sentir uma mistura de coisas, mas todas elas incapazes de me convencer a
ficar no local.
Enfim, detesto academia,
mas sou uma mulher que cresceu sendo estimulada por uma sociedade
superficial, consumista e obsecada com a forma física as pessoas a ser paranóica com meu próprio corpo. Por
isso, apesar de me considerar uma pessoa inteligente e reflexiva ainda
me preocupo com meu barrigão de cerveja e minhas celulites quando o verão vai se aproximando e me sinto coagida a usar biquini.
Um saco, porque esse é o tipo de coisa que me faz deixar de tomar
cerveja uma sexta-feira por ano para ir à droga da academia. Essa
paranóia e a curiosidade pra ver de perto uma tal de Zumba que segundo
Florinha é a sensação do momento na america latina. Nossa academia começou a oferecer o tal curso e então resolvemos ir conferir.
Agora foi que essa estória "esquisitou" de vez! Cris, sexta-feira à noite, na academia, sem cerveja de graça e fazendo aula do ritmo do momento. Mas o inusitado não para por aí: O professor é na verdade especialista em artes marciais e lutador de Muy Thai. O cara é alemão de uma cidadezinha próxima de Bremen e tem um swing que dasafia muito brasileiro. Apesar de não ser nem meu tipo de música, nem de dança, não posso deixar de admitir que me diverti bastante. Zumba foi como uma mistura de tudo quanto é de dança maluca que o carnaval baiano já produziu. Me acabei de rir, com o que pra mim pareceu mais um grande equívoco da globalização.
Ali estava eu em uma academia na Alemanha, cercada de pessoas de várias
partes da Europa, ouvindo músicas de toda América Latina e tentando
aprender os passos das danças que eu via surgir a cada verão em Salvador.
O professor demonstrava algo e eu reconhecia alguma dança como samba ou salsa. Em outros momentos reconhecia alguma prezepada do tipo, bomba, dança da galinha, fricote ou uma dessas maluquices criadas pela indústria do axé. E eu ia dançando,
afinal minha filosofia é: foi pro pagode, tem de requebrar até em
baixo, mesmo correndo o risco de dar um jeito na coluna e nunca mais
poder ficar com a postura ereta. Mas como apesar de globalizado isso
aqui ainda é Alemanha, algumas pessoas precisavam saber exatamente
quantos graus tinham de inclinar o troco e qual o tamanho da
circunferência que o quadril tinha de descrever na hora que a música
dizia "mexe a bunda pra cá e pra lá".
E foi aí quando tudo desandou de vez. Da próxima vez que estiverem em alguma festinha, dançando como se não tivessem coluna vertebral, ao som do reboleixon, ou de qualquer outro ritmo insano que a Bahia criar, pensem em como vocês explicariam ou demonstrariam a tal dancinha pra um turista bem descoordenado e vão entender como eu me senti nesse momento. Parece que todo meu senso de ritmo me abandonou e os pés não se entendiam. Isso sem contar que ficou praticamente impossível fazer com que meus braços participassem da brincadeira junto com os pés. Era como se cada parte do corpo de repente tivesse decidido que ou iam dançar sozinhas ou não dançavam. E eu não posso culpá-las afinal de contas, para mim dançar está mais para língua que para matemática. Ou seja, claro que tem regras, mas muitas vezes uma pessoa pode comunicar a mesma coisa de forma diferente e mesmo quando a regra é empregada de forma errada, muita vezes o resultado é lindo. Assim quem consegue relaxar e se entregar ao ritmo acabam dançando melhor do que muitos que apesar de conhecer os passos acaba por se esquecer de seguir a música.
O resultado dessa estória que já começou meio insana foi o seguinte: o professor estava preparadíssimo e conseguiu demonstrar passo passo como se dança
o samba. Todo mundo entendeu direitinho e teriam anotado se pudessem,
mas só quem sambou junto com a música mesmo, foram os que não estavam nem aí para as regras e basicamente estavam alí pra suar e se divertir.
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