Lembro
que quando eu era criança tudo o que mais queria nessa vida era ter um
irmãozinho. Aliás, um irmãozinho, não. O que eu queria era um irmãozão.
Nas minhas fantasias de criança, o irmão que me fazia falta nunca era um
bebê chorão menor do que eu e sim um menino que seria sempre um
pouquinho mais que eu: mais velho, mais sábio, mais popular, mais
conhecido. Muito estranho isso, mas quando criança eu trocaria, sem
hesitar, qualquer situação em que eu fosse o centro das atenções pela
chance de poder dizer: “O quê? Você conhece fulaninho? Ele é meu irmão.”
Eu desejava aquilo com tamanha intensidade que minha cabecinha avoada
de criança nem se tocava do óbvio que era a impossibilidade daquele
sonho. Eu já estava aqui no mundo, ter um irmão mais velho só poderia
virar realidade em outra vida.
O tempo
foi passando e com ele aquela fantasia foi dando lugar a outras. Agora
queria era passar no vestibular, conseguir juntar dinheiro pra fazer um
intercâmbio, comprar um carro, arrumar um namorado legal, comprar uma
casa, conseguir aquele emprego bala, ganhar na loto, ter uma ilha. À
medida que a gente vai crescendo, nossos sonhos vão ficando mais
materiais, mais práticos e comigo não foi diferente. Uns sonhos foram se
realizando rápido, outros de forma mais trabalhosa e outros foram
mudando ou terminaram sendo completamente substituidos. No geral, me
considero uma pessoa de sorte por quase sempre conseguir alcançar minhas
metas, meus objetivos.
Mas
realizar sonhos leva tempo e dá trabalho. Por isso eu estudei muito,
troquei de universidade, trabalhei aqui e acolá, trabalhei por merreca,
fiz amigos, perdi amigos, fiz cursos, viajei, galinhei bastante - porque
ninguém é de ferro - me apaixonei, chorei, dei muita risada, caí,
levantei, quis mandar tudo pra puta que pariu, virei zen, fiz yoga,
perdi a paciência, a recuperei e, durante todo esse tempo (mais ou menos
a partir do momento em que eu comecei a deixar de lado o desejo de ter
um irmão mais velho para dar preferência a outras fantasias), uma pessoa
esteve presente acompanhando tudo isso.
Olhando pra trás, lembro
exatamente do nosso primeiro contato: eu estava anotando alguma coisa
num caderno, apoiado na minha mão, de pé, em frente à sala de aula,
antes de o professor chegar. Ele estava encostado na parede, bem ao lado
do papel que eu queria ler. Tentei ignorar sua presença, mas ele não é o
tipo de pessoa que alguém consiga ou queira ignorar. Era um adolescente
lindo, alto, com cabelos longos e brilhantes de dar inveja a qualquer
menina, seus olhos eram super meigos, era muito, mas muito charmoso
mesmo e como era cheiroso! Simpático como ele só, começou a brincar
comigo, tentando me atrapalhar com minhas notas. Dei risada e senti meu
coração se aquecer. Mal sabia eu que meu sonho de menina estava se
realizando. Naquele exato instante, estava nascendo para mim meu irmão
mais velho.Desde
então, Lubi, meu irmão esteve presente em minha vida em todos os
momentos. Nas fases ruins ele me ouve, aconselha, oferece outra
perspectiva da situação. Quando eu passo dos limites, meu irmão me dá
umas chamadas pra real também. Coisas de irmão mais velho.
Assim como todo bom irmãozão, ele sempre foi um grande modelo pra mim e é em grande parte responsável pela minha formação como ser humano. Sem ele, muitos de meus melhores momentos de vida nem teriam acontecido. Entre as tantas coisas que ele fez por mim, está o despertar do meu interesse por questões sociais e políticas, a ampliação do meu universo musical e ter me apresentado ao meu marido, o primeiro grande amor de minha vida. Faltaria espaço aqui pra contar quantas vezes ele aguentou minhas bebedeiras e me levou sem nenhum arranhão sequer de volta pra casa.
Meu
irmão e eu já tivemos momentos super próximos de quase sermos um só, ao
ponto de algumas pessoas nos chamarem Criselubi, e outros, mais
distantes, de meses sem saber um do outro. Hoje em dia eu sei que aquela
melancolia que insistia em me acompanhar apesar de eu estar bem, vinha
do fato de estar distante de meu irmão. Porque naqueles momentos de
distância não se passava um dia sem que eu pensasse nele. Lembrava dele
em festas, quando via algo que eu sabia que ele ia gostar, queria fazer
comentários que eu sabia que só ele iria entender. Como é comum entre
irmãos, já brigamos também. Mas a gente sempre aprende com nossos
conflitos e ao final de cada briga, nosso elo se torna cada vez mais
forte. Mas não gosto de brigar com meu irmão. Quando isso acontece, a
dor é tão grande que parece até que briquei comigo mesma.
O meu
maior pesadelo de mulher adulta é o medo de acordar um dia e me achar
sozinha no mundo. Sem filhos, sem marido e sem ninguém com quem dar os
últimos passos de minha vida. Pesadelo bizarro, eu sei, mas que
recentemente parou de me atordoar, sabe por quê? Esta semana eu estava
caindo e meu irmãozão mais uma vez me segurou. Dono de uma sabedoria
incrível, mandou eu chorar direito e me disse todas as coisas que eu
precisava ouvir. Cada palavra era uma carícia em minha alma. No final,
ele completou: haja o que houver, seja quando e onde for, aconteça o que
acontecer, pode me chamar que eu vou na mesma hora te socorrer, como
você precisar. Senti novamente meu coração se aquecer. Olhei fundo nos
seus olhos, que ainda carregam toda a doçura da adolescência, mas com um
fator a mais que é a segurança e a maturidade do homem que ele se
tornou.
Acreditei completamente nas palavras dele. Tenho certeza de que
nossa amizade e nosso elo de irmãos são eternos e de que eu nunca vou
precisar passar por nada sozinha, se não quiser. Fui relembrada do
porque a vida vale a pena e passei a noite agradecendo a papai do céu
por me ter concedido o desejo impossível de criança de ter um irmão mais
velho.
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