segunda-feira, 25 de maio de 2009

Mas que beleza...

Imagem: Pixabay


Quinta-feira passada foi a final de Germany's Next Top Model. Não vou entrar em detalhes sobre esse tipo de programa. O fato é que eu estava assistindo por opção mesmo e quem nunca assitiu nenhum programa alienante, sem a desculpa de que "estava mudando de canal e me deparei com isto ou aquilo" que atire a primeira pedra.

Enfim, as duas finalistas eram lindíssimas e completamente diferentes na aparência. MandyBork, a rainha da passarela, com longos cabelos loiríssimos, olhos azuis brilhantes e pele clara como sorvete de vanila e SaraNuru com suas madeixas igualmente longas e abundantes, porém escuras como a noite, com um sorriso meigo desses de covinha em cada lado do rosto e de pele cor de chocolate ao leite. Tratando-se de um concurso pra determinar a mulher que sairia na capa de uma das maiores revistas femininas da Alemanha, vocês podem imaginar quem foi escolhida vencedora. Sara, é claro!

Esse resultado colocou meus parafusos pra pensar em relação à beleza e aos muitos caminhos dolorosos que nós seres humanos percorremos em busca de aceitação e felicidade. Passei minha adolescência inteira lutando pra ser considerada bonita em uma cidade onde apesar da maioria ser afro-descendente, o padrão de beleza sempre foi meio europeu. Naquela época, constatei com tristeza que pra ser considerada bela tinha de no mínimo ter cabelo liso, o que me custou fortunas em tratamentos de cabelo. No entanto, um dia cheguei num ponto onde pensei: Chega de alisabel! e dei um basta naquela loucura. Quem quisesse me achar feia que achasse. Tinha valores mais importantes pra dar atenção. E essa mudança de atitude acabou colocando muitas pessoas não fúteis em meu caminho. Para aqueles novos amigos, minha aparência era a última coisa que importava nesse mundo.

Ao mesmo tempo comecei a conhecer vários outros negros e negras que como eu tinham seus traumas e questões de beleza, raça, alisamento de cabelo, aceitação social, cor de pele, preconceito e quinhentos anos de história brasileira pra criar um certo incômodo vez ou outra. Poder conversar com pessoas que entendem nossa perspectiva nos ajuda a entender melhor pelo que passamos. Esse entendimento pode funcionar como um verdadeiro calmante para questões mal resolvidas. No Brasil nunca passei muito tempo sem saber que era vítima de preconceito declarado, até mesmo porque nosso povo vive dizendo que isso não existe no nosso território. No entanto, posso afirmar sem sobra de dúvida que foi difícil crescer sem nunca ter visto um rosto parecido com o meu nos anúncios de televisão e sem nunca poder aprender dicas de maquiagem e cuidados com os cabelos nas revistas femininas enauqnto era isso que todas as meninas de minha idade faziam. Tenho notado que essa situação está mudando aos poucos. Fico feliz. Quem sabe minha filha vai se sentir à vontade pra usar o afro dela numa boa e ser considerada a gatona da escola por causa e não apesar disso.

E por falar em cabelo, quando cheguei aqui na Alemanha percebi que quanto mais indomável ele está, mais elogios eu recebo. Comecei a perceber também que aqui beleza são outros quinhentos. Loiras pintam cabelo de preto, dão permanente pra ter cachinhos e frequentam salões de bronzeamento artificial. Me espanta ver que aqui tem mais negro na televisão e nas páginas das revistas do que no meu Brasil. No país onde a maioria tem cabelo e olhos claros "black is really beautiful" e de acordo com Heidi Klum a próxima supermodel daqui é negra. Ela é mesmo lindíssima, mas eu me pergunto: será que a gente tem de sempre querer ser diferente do que somos? Será que o padrão de beleza não pode nunca ser o nosso próprio padrão individual? Se gosto é pessoal, porque que a brasileira quer parecer Gisele Bündchen e a alemã quer parecer com Naomi Campbel?

A mídia mundial quer sempre fazer nós mulheres nos sentirmos inadequadas a todo custo. Mulher insatisfeita compra mais. A lavagem cerebral é tamanha que a gente acaba se convencendo que não dá pra ser negra no Brasil, loira na Alemanha, gorda e coroa em nenhum lugar do mundo. Então a gente sofre e se sente mal na própria pele porque onde quer que se olhe em busca de algum modelo só se vê supermodelo magrela e de preferência com um visual diferente do da maioria. O que a mídia e o senso comum chamam de exótico. Eu chamo de neurótico. Mas como é difícil não se deixar influenciar por isso...